POETAS
Que sejam muitos,
Cada vez mais numerosos.
Que invadam as praças,
os morros e as mansões.
Que espalhem suas letras tortas,
poesias concretas de amor!
Que sussurrem nos ouvidos dos que querem ouvir e derramem palavras incansáveis,
gota a gota, no coração daqueles que estão
insensíveis,
anestesiados,
adormecidos!
Que a poesia seja semente,
daquelas insistentes,
que brotam de onde menos se espera,
que resistem a água escassa,
ao solo pedregoso
e às mãos que teimam em arrancar os brotos.
Que os poetas contagiem o mundo de esperança,
tragam sorrisos e não desistam nunca de sonhar!
Denise Morais
imagem: pexels.com
Meu Deus, não Te quero mais...
Eu posso passar até
… três semanas sem comida, mas sem Ti, não me sustento.
… três dias sem água, mas sem Ti, não me sacio.
… três noites sem dormir, mas sem Ti, não repouso.
… três horas sem abrigo, mas sem Ti, não estou protegido.
… três minutos sem ar, mas sem Ti, não tenho alento.
Sem as Três Eternas e Santíssimas Pessoas, não existo.
Meu Deus, eu não Te quero mais...
Meu Deus, eu preciso de Ti.
Michael Martinez SJ
http://www.mikemartinezsj.com/
Perto da criação do mundo
Para a minha irmã Teresa e para o meu irmão Zé Pires
Senhor, dai-me a inocência dos animais
Para que eu possa beber nesta manhã
A harmonia e a força das coisas naturais.
Apagai a máscara vazia e vã
De humanidade,
Apagai a vaidade,
Para que eu me perca e me dissolva
Na perfeição da manhã
E para que o vento me devolva
A parte de mim que vive
À beira dum jardim que só eu tive.
Sophia de Mello Breyner Andresen
imagem: pexels.com
IN MEMORIAM
Esses mortos difíceis
que não acabam de morrer
dentro de nós; o sorriso
de fotografia,
a carícia suspensa, as folhas
dos estios persistindo
na poeira; difíceis;
o suor dos cavalos, o sorriso,
como já disse, nos lábios,
nas folhas dos livros;
não acabam de morrer;
tão difíceis, os amigos.
Eugenio de Andrade
De Ofício de Paciência (1994)
Cruzaram-se como estranhos,
sem um gesto, uma palavra,
ela indo em direção à loja,
ele para o carro.
Talvez por pânico
ou por distração,
ou por deslembrança
de que por um breve tempo
amaram-se para sempre.
Não há garantia, aliás,
de que fossem eles.
Talvez de longe sim,
mas de perto de jeito nenhum.
Eu os avistei da janela,
e quem olha do alto
é quem mais facilmente se engana.
Ela sumiu atrás de uma porta de vidro
ele sentou-se ao volante
e partiu depressa.
Portanto, nada aconteceu
mesmo que tenha acontecido.
E eu, só por um instante
certa do que vi,
procuro agora num poeminha casual
persuadi-los, caros leitores,
de que isso foi triste.
Wislawa Szymborska
Todos os poemas:
in Para o meu coração num domingo
[TENHO CHORADO]
tenho chorado
no meio da rua
dentro do carro
ao telefone
com estranhos
falo em voz alta
do luto
da falta
o coração despedaçado
à espera de uma palavra
que conforte
que nunca é
o suficiente
todas as águas
vivas
correm
se atormentam
dentro de mim
queimam
Marina Rabelo
Lapinha
O MUNDO
o único lugar confortável no mundo
é o amor
depois que os espinhos
são retirados da pele
esse é o nome
de quase tudo
Déborah de Paula Souza
Todos os poemas:
in Vermelho vivo
Laranja Original, São Paulo, 2021
254
“Esperança” é a coisa com plumas —
Que na alma se aninha —
Seu canto não tem palavras —
Sempre a mesma — ladainha —
Soa bem — na ventania —
E só a forte tormenta —
Há de calar a Passarinha
Que a tantos acalenta —
Ouvi-a na terra mais fria —
E no estranho Mar sem fim —
Mas — nem em situações extremas
Pediu migalhas — pra Mim.
Emily Dickinson
Todos os poemas:
in Poesia Completa – Volume I: Os Fascículos
Tradução, notas e posfácio: Adalberto Müller
Prefácio à edição brasileira: Cristanne Miller
Editora UnB, Brasília, 2020
O MUNDO
o único lugar confortável no mundo
é o amor
depois que os espinhos
são retirados da pele
esse é o nome
de quase tudo
Déborah de Paula Souza
• Todos os poemas:
in Vermelho vivo
Laranja Original, São Paulo, 2021
I (2)
Abandonei o tempo dos limites.
É do infinito que a alma mais tem fome.
A vida tece a urdidura do avesso
E é de loucura que o corpo se sacia.
Minha paixão não teme estes abismos.
O que se busca é nesta névoa que se oculta.
Luíza Mendes Furia
In Vênus em Escorpião - Patuá, São Paulo, 2016
Página 3 de 16