Trazemos a Ti, Senhor, as nossas travessias, as nossas idas e vindas atarefadas de cada dia, esse ir daqui até ali sem enxergar direito, esse tatear incerto, mas sedento e cheio de desejo.
 
Trazemos a Ti os planos que fazemos: aqueles que conseguimos concretizar e cuja realização nos consola; e aqueles que ficam adiados para mais tarde, ou se desfazem em nossas mãos como um frágil anel que se quebra.
 
Trazemos a ti o cotidiano que vamos construindo, tanto quando nos sentimos em paz e em harmonia, como quando sofremos com as pedras do caminho e as tensões de uma marcha que nos aparece desapontadora, desgastante e inglória.
Trazemos a Ti as épocas de entusiasmo, quando sentimos que milagrosamente todos os elementos convergem e passam a coincidir, como se a existência fosse uma luminosa dança que vai se desenrolando, e nada mais.
 
Mas também trazemos a Ti o nosso estranhamento e a nossa solidão, quando sentimos a textura do mundo como desmedida, insustentável e até hostil.
 
Trazemos a Ti a alegria que libera no tempo uma música inesquecível, aquela doçura inocente que se transcreve no riso, o sentido vibrante e uníssono dos momentos de comunhão, quando a existência parece extasiar-se diante de Ti.
Mas também os dias instáveis, quando a dor parece ser o único idioma capaz de nos expressar ou quando nos sentimos deslegitimados e vazios, sem saber o que dizer.
 
— Cardeal D. José Tolentino Mendonça (homilia)
25.02.2024
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