“FEIRA  DAS  VAIDADES”

– Dir. Mira Nair (indiana) – Eua/Inglaterra

 

Tema: “A    VIRTUDE    TRAÍDA”

 

Gostei do filme! Gostei mesmo! Já no começo, a apresentação sensível e cheia de belas imagens. A saia colorida que roda e roda, já antecipando a presença sutil e forte da Índia. Índia que, na exuberância do seu colorido, sabor, música e dança, fará um contraponto sutil à formalidade, aos cinzas e à contenção e rigidez da sociedade inglesa. Que se faça a mistura!

 

Gostei porque as personagens são todas verdadeiras. São mostradas em sua densidade e na complexidade de sua gama ampla de sentimentos. Elas não são boas nem más. Não há vilões e nem heróis. Claro que há pessoas melhores, como a Amélia, na sua ingenuidade e no seu amor devocional e cego a George. Há piores, como poderíamos pensar ser a protagonista, Rebecca – Becky. No entanto, se observarmos bem, nela há também lealdade, gratidão, senso de justiça e integridade. Não a vimos espezinhar gratuitamente quem era menor e frágil, ao passo que vimos todos os “maiores” (social e economicamente) a espezinhar e a renegar quem estava em condição inferior. Todos ali sonham, desejam, têm e não têm; há inveja, arrogância, estupidez, perspicácia, sordidez, orgulho, honra e maldade; há sonhadores e ingênuos; há gratidão e reparação. Mas, cada um, de uma ou outra maneira, “sofre na pele” ou “paga pelos seus pecados”. Ninguém saiimpune! Ninguém trai uma virtude sem viver as perdas que lhe cabe!

 

Cenas que já antecipam o que será essencial na trama: a menina e o seu teatro de fantoches: ali já aparece a filha que a mãe dá a um milorde e a condição de “fantoches”: todos manipulados além deles mesmos, como acentuará Seyne mais tarde. O homem rico andando entre e sobre a miséria, indiferente ao seu entorno; como um impávido colosso, atira moedas às crianças e segue em busca do seu objetivo: comprar a Arte, numa tentativa de ter o Sensível perto de si, já que não tinha o que dá sentido à vida, que é o “amar e ser amado” (palavras dele). A venda do quadro: a filha, valorizando o que era dela, a mãe falecida (modelo para o pai pintor), pede um valor maior e consegue, mas fica sem o quadro. Mais tarde, esta situação lhe será lembrada: ela “vende-se” por um valor alto para “escalar” socialmente, mas fica sem ela mesma, sem o amor e sem o filho.

 

Aproveitemos o legado que os grandes clássicos nos trazem: a vida é complexa, somos determinados pela nossa história familiar, condição social e econômica; não somos “bonzinhos” e nem “maus”, e iremos responder por cada ato nosso. No entanto, sempre teremos atos que nos farão melhores e trarão também o melhor que o mundo pode nos oferecer. Cuidemos deles!

 

Tudo termina na Índia, numa promissora imagem de mistura, sincretismo e alegria, sem que a marca da origem desapareça: o baú de R.S. está lá, com ela, como esteve desde o início de sua busca de um lugar.

 

Sugestão: como há muitos personagens e todos complexos e belos, como seres humanos que somos, rememore cada um e encontre ali as qualidades e defeitos e aproveite para refletir sobre o que tem feito e como tem vivido.

 

Maria Teresa Moreira Rodrigues

Psicanalista em Campinas-SP - Espiritualidade Inaciana