“TAMPOPO – Os brutos também comem espaguete”

 Juzo Itami - Japão. 1986

 

Os brutos também amam.

E todos nós precisamos buscar a nossa melhor receita do Viver.

 


O filme é rápido e várias pequenas cenas entrecortam o enredo central. Alusões várias são feitas a outros filmes, atores (e não é que temos um Clint Eastwood japonês!), diretores e trilhas sonoras. A despeito do riso que o filme desperta em nós, ele é profundamente sério e apresenta-nos várias facetas do ser humano.

 

Já desde o início somos convidados a pensar o filme como o desenrolar de uma vida, ou pelo menos de um trecho dela. E de forma hilária, somos “intimados” a tomar a “sala de cinema” como um local que merece nossa atenção, cuidado e silêncio! E nada de salgadinhos “saborosos”, e muito menos em saquinhos barulhentos! É isso aí! E surgem nossos dois primeiros “heróis”, lendo sobre como preparar e tomar uma sopa de Lamen (ou o que quer que seja!). Cuidado e afeto são necessários, pois do contrário não será possível “sentir e saborear” tudo o que a refeição (a sopa e tudo na vida!) nos oferece; há uma sequência a seguir e não vale sorver o conteúdo de uma só vez; a cada ingrediente deve ser dado seu valor e ele tem o momento certo de ser ingerido; ou seja, tudo deve estar envolto em um clima de atenção e reverência. Não deveria ser assim nossa atitude frente à vida e frente às pessoas?

 

Tampopo (T.) é uma mulher como tantas de nós. Trabalha, cria o filho, busca desenvolver um negócio próprio, e o faz à sua maneira que, no entanto, parece não ser a mais inspiradora e rentável. Seu filho é maltratado e apanha dos amiguinhos da escola. Tem um pretendente que lhe faz convites atraentes, mas sem o tato necessário para que ela possa confiar e interessar-se por ele. Mas, um dia surge o “herói”! Sempre precisamos de alguém que nos defenda e mostre que algo pode ser diferente. Surge uma situação que instala o desejo de “ser melhor”, e T. reconhece que pode mudar e humildemente pede que ele a ajude a encontrar a “receita melhor” de Lamen. E aí começa a saga! É necessário disciplina, reconhecimento dos caminhos e situações já existentes, assim como submeter-se aos obstáculos para que sejam transpostos! E isso inclui desde treinar mudar a panela cheia, da pia ao fogão, como até mesmo fazer “corridas”! Enquanto eles vão de um lugar a outro tentando descobrir “mestres” e como os concorrentes fazem sua sopa, outras cenas cruzam o caminho deles e o desenrolar do filme (vida). Lembrar que muitas vezes as cenas são hilárias e surrealistas, mas muito evocativas.

 

. O belo gangster e sua estonteante namorada: o melhor dos lugares e das iguarias deve lhes ser oferecido; a sedução e as sensações eróticas são centrais e têm que ser exploradas em seu máximo. No entanto, no derradeiro momento, o que ele evoca e compartilha é uma lembrança que nos faz pensar em seu desejo de ter chegado ao “inverno” da vida e ali poder sorver as raízes do vivido.

. O velhinho golpista: quem é que engana quem? Levar vantagem sobre o outro? Atenção!

. O trabalhador que corre até sua casa... E ali estamos frente ao drama da morte! No desespero, submissão feminina? Autoritarismo masculino?! O que importa é a partilha da última refeição!

. O homem e sua infecção dentária: no veloz trem da vida... do que se terá alimentado? Sorvete e açúcares ou uma alimentação balanceada e saudável? Ver o menininho e o aviso da mãe...

. O rico senhor que é salvo... A gratidão e solidariedade.

. Os “sem teto” e seu “mestre”: solidariedade e alegria.

. Os dois homens enamorados pela mesma mulher enfrentam-se... Mas, desde o respeito reconhecem o que cada um tem de valor e unem-se à mesma causa: o cuidado para com a amada... e para consigo mesmos!

- E a melhor receita da “sopa de Lamen” estava ao lado dela, com o “antigo pretendente”...

 

Quantas vezes o que precisamos está justo ao nosso lado, e não pudemos ver... Sem ajuda e respeito não podemos encontrar “nossa receita”, fazer uma “repaginação” em nossa “fachada” interna e externa, como aconteceu com Tampopo. E é desde essa maneira de nos relacionarmos que cada um poderá seguir sua vida... como aconteceu no filme! Que assim aconteça em nossa vida!]

 

Maria Teresa Moreira Rodrigues

psicanalista - espiritualidade inaciana