Vivemos em tempos de aceleração. Todos estamos muito ocupados. Trabalhos, viagens, vida familiar, amigos, exercícios físicos – todos estamos o tempo todo ocupados com uma infinidade de solicitações. Mesmo o tempo de descanso é inundado pelas redes sociais e a internet. Não temos tempo a perder. O grande pecado de nossas sociedades é ficar desocupado, pega mal, é sinal de preguiça e falta de criatividade. Em sociedades capitalistas, perder tempo é perder dinheiro: Tempo é dinheiro! (Time is Money!)

Diante dessa realidade contemporânea, o filósofo Byung-Chul Han escreve mais um instigante ensaio: Vida Contemplativa ou Sobre a Inatividade (2023). Nesse texto, ele faz um elogio à inatividade, à lentidão, à paciência e à contemplação. Para Han, a vida só recebe seu esplendor na inatividade. Ele defende que é no silenciar-se que a vida adquire profundidade, é na inatividade que a vida reluz e ganha intensidade, é na contemplação silenciosa que a vida se nos revela profunda, intensa e incomensurável.

No entanto, não é esse o ritmo de nossa sociedade. As sociedades capitalistas são caracterizadas pela utilidade, pela funcionalidade, pela eficácia e pela velocidade. Trabalho e desempenho são nossos novos mantras para os quais fazemos reverência cotidianamente. Hoje, a existência humana está absolutamente absorvida pela atividade frenética. As consequências desse frenesi são perigosas. Nossas sociedades se tornam sociedades do consumo feroz e imediato que isolam e separam as pessoas, que as transformam em consumidores solitários e dependentes de mais conteúdo informacional que é, religiosamente, absorvido sem digestão. Nessas sociedades todos estão conectados, mas ninguém sabe escutar. É uma comunicação sem comunidade, na qual o ruído da comunicação, e da informação em excesso, cria uma sociedade onde ninguém escuta, mas todos produzem conteúdo falando sem cessar.

Um exemplo claro desse estado atual é a dificuldade em sermos pacientes e lermos poesia. Não temos mais paciência para esperar que a realidade, em seus processos, lentamente, amadureça e dê frutos. Angústia, ansiedade, impaciência e agitação compõem o cardápio cotidiano de nossos problemas. Mas, também para Han, nós, os contemporâneos, mal lemos poesia dada a necessidade da lentidão, do vagar, exigidos pela leitura poética. A perda da capacidade contemplativa repercute em nossas relações pessoais, mas também, em nossa relação com a linguagem. A linguagem poética é linguagem contemplativa. Ela demanda tempo, vagar, ruminar, esperar. A poesia desarma a linguagem como mera informação, e nos coloca no nível da abertura. Ela nos abre ao inesperado, ao novo, ao inusitado.

Paciência, poesia e contemplação, segundo Han refletindo a partir de Heidegger, são capacidades que não agem. Por isso mesmo, elas nos trazem de volta para onde sempre já estamos. Elas nos abrem ao Pathos, ao padecer e ao sofrer; mas também a Eros, ao desejar e ao exceder. Elas nos lembram que somos seres radicalmente abertos, contemplativos na ação. Portanto, neste ensaio, Byung-Chul Han nos lembra muitas coisas importantes: entre elas, que somos seres contemplativos, que a paciência nos coloca inteiramente na existência e que os poetas são excelentes companheiros de caminhada. Essa última lembrança me traz à memória a profunda consideração do poeta Manoel de Barros que disse: “Minhocas arejam a terra; poetas, a linguagem” (Livro de Pré-Coisas, 1985). Mas isso já é uma outra história.

Elton Vitoriano Ribeiro, SJ é professor e pesquisador no departamento de Filosofia, e reitor da Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE)

In: site da FAJE

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