Assim como temos um lar físico, que vai de nossa casa ao universo, também temos um lar mental/espiritual, constituído pelo conjunto de recursos simbólicos com os quais, sabendo ou não, andamos pela vida. Uma parte desses recursos pertence ao território da Ética, disciplina reflexiva que está relacionada ao campo da ação, ao modo como conduzimos nossas vidas e, mais basicamente, à liberdade que nos caracteriza enquanto humanos. Se nossas ações fossem equivalentes, se dessem origem às mesmas  conseqüências ou se fôssemos presas de algum determinismo, a Ética seria desnecessária. Como nada disso acontece, a Ética se faz presente e se interessa pelo tipo de ação ou conduta que torna a vida mais legítima, mais humana, mais defensável.  Daí que acusar alguém de falta de ética é desaprovar o que ele faz, é se opor aos valores por ele defendidos.

 

Vamos resgatar uma palavra antiga, dessas que não usamos tanto, mas que sempre esteve associada à Ética. Na linguagem do dia a dia raramente aparece: virtude. Alguém se lembra de referir-se a um amigo/amiga como virtuoso/virtuosa? Difícil, não é mesmo? Virtude é, hoje, uma dessas palavras frias, das quais mantemos distância. Mas o que deve ser entendido como virtude? Não é o caso de nomear atos ou ações virtuosas. Seria interessante, mas não bastaria. Virtude tem a ver com a improbabilidade de agirmos na direção do que foi dito mais acima: na direção do que é mais humano, mais defensável, mais legítimo. Mas porque improbabilidade? É que um comportamento virtuoso é mais difícil, perde numericamente para comportamentos não virtuosos, que são mais prováveis. Nossa inclinação imediata é agir de acordo com nosso interesse mais corriqueiro, em obediência aos costumes do lugar onde vivemos, a partir de expectativas que os outros nutrem sobre nós e assim por diante. Ora, a virtude tem a ver com a suspensão desses caminhos, com a disposição de atuar em vista de um fim discernido de forma mais reflexiva, mais corajosa, mais custosa,  em concordância com um valor escolhido mais livremente, não importando a quota de sacrifício envolvida. Nestes tempos onde todo mundo reclama por mais Ética, é bom nos lembrarmos dos custos associados à Ética, em tudo contrários à voracidade do imediatismo dos nossos dias. Se, de fato, a Ética é uma questão importante para nós, conversar sobre a experiência da virtude pode ser um bom começo.

 

Para pensar na quinzena:

“  Não se pode receber da verdade mais do que nela se investiu” ( Milorad Pavic, Dicionário Kazar)

 

 

Ricardo Fenati

Equipe do Centro Loyola

15.12.2012