Filme: “BROKEBACK   MOUNTAIN” 

Diretor: Ang Lee  -  EUA

 

Passa a noite. Vem o dia. Outra noite. Mais um dia. A montanha lá!

 

As ovelhas sobem, descem. A tempestade assalta o dia. O frio invade a noite. A montanha permanece lá, contemplando e em seu regaço acolhendo tudo o que lhe chega.  A natureza mostra força e imprime sua marca indelével, no coração, no corpo, na memória e na vontade. O amor acontece!

 

Passam-se os anos. Pessoas chegam e ficam. Fatos se seguem. O cotidiano dá o tom da seqüência a que não se pode evadir. A vida continua em sua marcha inexorável e a ela se submetem a vontade, o desejo, o sonho, o concreto do fazer e ser. Mas, à vida não pode se submeter o que é natural dela mesma: quando o amor acontece! E assim vemos surgir à nossa frente:

 

A alegria não passível de disfarce na expectativa, na espera e chegada do encontro amoroso que, ao acontecer, cega e encobre tudo que não seja o amado. A euforia e a vitalidade que só o amor verdadeiro traz. Contudo, por ser verdadeiro, traz também a tristeza e o embotamento do ser, sobretudo quando não pode ser vivido em sua plenitude. E assim constatamos:

 

As marcas emocionais que impedem ultrapassar o vivido e criar um novo padrão de amor, de entrega e confiança, em si e no outro. A dor expressa no olhar baixo, que mostra o que quer esconder: o coração desejoso do encontro impedido. A fala contida, embargada em seu caminho, pelo conflito insolúvel do desejo e do real. O olhar terno e sedento de encontro daquele que assiste, impotente, à luta do amado entre desejar e não poder. As propostas insistentemente repetidas de buscar uma casa e lugar para o desabrochar do amor e de uma vida compartida rotineiramente. A negativa sempre repetida e rudemente imposta. Temores e impotência sem fim, que se transformam em agressividade desmedida e auto-destruição insidiosa.

         Quem de nós não viveu algo semelhante? Ou viu acontecer por perto?

         Ennis del Mar e Jack Twist, emblematicamente, vivem e nos mostram, de forma contundente e dramática, a dor, a solidão e o amor que, quando  impedido, desdobra-se em danos e deixa seqüelas em tudo e em todos.

 

Não restrinjamos nosso olhar a um amor homossexual; às convenções, preconceitos e intolerância. Não fixemos nossa atenção nas famílias que eles formaram e com as quais não puderam ser autênticos. Ou melhor, autênticas foram as tentativas de todos em formar as famílias possíveis. Alma e suas filhas e o sempre enamorado dela, o gerente do mercado em que ela trabalhava. Lureen e seu gosto tipicamente americano pelo dinheiro e pelo consumo. Ennis e suas tentativas de firmar-se, mas fracassando sempre por não poder olhar além, no horizonte. Jack e seu esforço em afirmar-se frente a um sogro-macho-americano-onipotente.

 

O amor da filha que sempre buscou o pai. O amor da mãe que olha Ennis e o reconhece e aceita como o amor de seu filho. A filha que, ao casar, quer o pai junto. O pai que aceita e sai de seu isolamento, por amor a ela e por amor àquele a quem nunca pode juntar-se. Pela janela do trailer, o olhar de Ennis vai para além do horizonte, para além de Brokeback Mountain...

 

Maria Teresa Moreira Rodrigues

Psicanalista - Espiritualidade Inaciana - Campinas-SP