"MINHAS MÃES e MEU PAI" – The Kids Are All Right

Lisa Cholodenko - Estados Unidos – 2010

 

Importante fazer referência ao título do filme, em seu original. O acento é colocado sobre como estão os filhos, e não sobre mães e pai. 

 

Tive a leve sensação de ser um filme "encomendado"... Encomendado para mostrar que os filhos de casal homoafetivo podem ser melhor integrados que os de um casal hetero, como se vê a partir dos amigos respectivamente de Joni e de Laser.  A amiga de Joni sexualiza as relações, inclusive insinuando-se ou acreditando-se paquerada pelo pai-doador de esperma. O amigo de Laser é violento, agressivo com animais e com seu próprio corpo, tendo-o todo tatuado. Já Joni relaciona-se amorosa e discretamente com seu amigo indiano-americano, e só tem notas 10 em seu curso. Por sua vez, Laser é expoente em todas as modalidades de esporte.

  

Quase que vemos ali representada a famosa "família margarina" dos anúncios de TV. 

 

Claro que pode ser possível essa integração entre os elementos de uma família nuclear homoafetiva, mas ela foi-nos apresentada desde o mais estandar modelito "família feliz hetero". Ok. Já dissemos em filme anterior, "O amor é estranho", que as representações internas são hetero, masculino e feminino, independentemente do que é a opção genital. No entanto, os conflitos não podem ser vividos e representados tal e qual, pois os caminhos e descaminhos do desejo e das relações objetais, dentro da trama familiar e social, não são os mesmos; eles têm especificidade própria. 

 

O temor é de que esse olhar que pretende instalar como "natural" as relações homoafetivas, leve a uma superficialidade e a uma pasteurização das mesmas. E isso não os ajudará a serem mais felizes e integrados, pois pairará sobre eles um "final feliz hollywoodiano", ou mesmo "Rede Globo", que sabemos não ser o real do cotidiano do viver de qualquer um de nós. 

 

As personagens não têm densidade dramática. Elas transitam entre seus conflitos relacionais desde jargões psicológicos. Claro que se depreende que sentem e sofrem, mas elas discorrem sobre o que vivem, racionalizando e explicando, o que impede um amadurecimento do próprio adoecer psíquico, que é o que promove reais transformações psíquicas. 

Portanto, passam de uma experiência desestruturante para sua subsequente resolução, sem que a angústia edificante tenha se insinuado e apresentado suas desrazões.

 

Dois momentos em que houve flagrante movimentação autenticamente psíquica:

1. Quando demite o ajudante de jardinagem, por projetar nele seu olhar culpabilizante.

2. Quando Jules, no final do filme, toma a direção do carro, o que usualmente não fazia. Todavia, naquele momento, ela havia ganho confiança em si mesma através do seu próprio engano, e mesmo do ter podido "cometer um engano", indo além de ser o que Vic esperava dela, ou mesmo, ela de si mesma. 

 

O pai, doador de esperma, havia se tornado um homem realizado em seus negócios, mas não havia se encontrado amorosamente, estabelecendo vínculos duradouros. Passa a desejá-lo quando se encontra com a Paternidade, ou melhor, quando se descobre "fecundo". Essa é uma transformação psíquica valiosa: a partir da constatação do "fruto" possível, o desejo de "frutificar". 

Mas aí ele é "expulso" do grupo porque "transgrediu" uma norma implícita; podemos dizer que foi imolado pois invadiu o território do "sagrado", conspurcando a relação dos cônjuges.

 

Podemos pensar que eles, Paul e Jules, ao relacionarem-se sexualmente, desejaram "atuar" o que já havia sido consumado, que era um esperma encontrar um óvulo. Podemos pensar até que seria um desejo genuíno, inda que transgressor de uma ordem que se pretendia quase que onipotente: a relação das duas mulheres, das duas mães. 

 

. E assistiam a filme pornô, com casal homo masculino. ???? Desejo do complementar????

. E reproduziam todos os tics e maneirismos de casal hetero... A mulher-homem que dirige e é provedora da casa; a mulher-mulher que é insegura a respeito de si mesma, e termina por ficar "dona de casa" e cuidadora dos filhos... E isso vindo a ser inevitavelmente fonte de conflito e queixas.

 

Fiquei em meu interno, com o sem gosto de alguns “filmes americanos”! Que pena! 

 

Maria Teresa Moreira Rodrigues

Psicanalista - Espiritualidade Inaciana - Campinas-SP