O caminho para casa, o caminho para o coração
O aclamado diretor chinês Zhang Yimou (dos filmes “Nenhum a menos”, “Lanternas vermelhas”) nos brinda com um belo filme sobre os pequenos e grandes sacramentos escondidos em nossa vida. No caso, na vida de dois jovens que constroem um amor na simplicidade do cotidiano de uma pequena vila no norte da China, nos anos 1950. O filme “O caminho para casa” é baseado em um romance de Bao Shi intitulado Remembrance.
O drama começa em preto e branco com a chegada de o Luo Yusheng (Sun Honglei), um homem de negócios da cidade, na pequena aldeia onde nasceu. Ele vem para enterrar seu pai, o professor da vila, que morreu em um hospital em uma aldeia vizinha. Sua mãe idosa, Zhao Di (Zhao Yuelin), quer que seja feito o ritual conforme as antigas tradições: o corpo do marido deve ser trazido para a aldeia, a pé, carregado por homens: assim, o espírito de seu marido sempre saberá o caminho de casa.
O filho começa, então, a reconstruir a história de amor de seus pais: o filme ganha um colorido vibrante e nos transporta para os idos de 1950, na China. A partir daí, mergulhamos em pequenos gestos, olhares e palavras que, delicadamente, tecem uma relação de amor. A jovem engendra formas de se aproximar do professor, recém-chegado à aldeia: prepara seus melhores pratos e espera que ele escolha o dela, na mesa de almoço compartilhada e provoca encontros “acidentais”. A angústia dos apaixonados mistura-se à paciência de quem espera ler os sinais no ser amado...
Há algumas sequências significativas que atribuem a alguns objetos um valor sacramental. Assim é com a longa cena da mãe, num tear antigo, fiando a mortalha do marido. Não há pressa, não há angústia. Só uma dedicação e cuidado nesse último gesto antes do enterro do esposo. Outro exemplo é o do artesão consertando uma tigela quebrada, uma peça sem valor nenhum e ao mesmo tempo inestimável porque, nela, uma jovem apaixonada servira uma refeição ao seu amado. O diretor gasta vários minutos nesta cena em que entram apenas objetos, mas que é densa de significado. É que não existem objetos "em si". Todos eles estão impregnados da presença humana, tão mais comovedora quando se está falando da morte, e portanto da ausência.
Enfim, “O caminho para casa” é um desses filmes que nos trazem sentimentos bons,nos enchem os olhos de lágrimas, nos emocionam e provocam uma “saudade de não sei do quê” e, sobretudo, nos fazem acreditar no amor...eterno.
Graziela Cruz é jornalista e professora de cinema.