Do meu lugar de educador, tento ser um observador atento das mudanças que chegam com cada geração de alunos que entra em minha sala de aula.
 
Desse lugar privilegiado, vejo que as maiores transformações vieram com o desenvolvimento vertiginoso dos meios de comunicação de massa e sua influência na formação dessas novas gerações. Esse processo explodiu com a revolução da Informática e a popularização das Redes Sociais na Internet, turbinada pelos smartphones que, com um click, colocam o mundo na mão dos seus usuários.
Qual mundo?
           
A Televisão ainda tenta encontrar uma linguagem que dialogue melhor com a revolução da Web e, creio, vai chegar lá. A TV a cabo, ainda economicamente inacessível à maioria da população, já permite uma interatividade maior, assim como um cardápio de opções mais amplo e personalizado. Os aparelhos HD que programam e gravam o que interessa ao telespectador permitem que ele próprio componha a grade de seu interesse.         
 
Ou seja, aumentou o controle do usuário sobre a ferramenta, mas resta a questão do conteúdo.
Hoje, para desgosto dos vizinhos de sofá, quem tem o controle remoto nas mãos pode zapear por dezenas de canais, mostrando que é grande a quantidade. Já a qualidade...
  
O pior é que fazer críticas nesse território é perigoso, graças aos efeitos colaterais desse insuportável ‘politicamente correto’ que anda por aí. Em nome do respeito às manifestações culturais ditas ‘populares’, empurra-se sobre parcela significativa da população, em especial aquela fatia que já sofre com um sistema educacional falho e precário, o lixo traduzido num pacote de filmes, novelas, músicas, games que representam o que mais de alienado, alienante, idiota e idiotizante podem criar os nossos chamados ‘agitadores culturais’.
            
O processo é antigo. Desde os anos 1960 importamos e degradamos, ainda mais, as novelas mexicanas. Hoje, somos exportadores de tramas que, com a impecável qualidade global, reproduzem roteiros que se repetem exaustivamente, em torno de vilões e psicopatas elevados à categoria de heróis.           
 
Não sou puritano nem moralista, mas ver um personagem que, durante recente novela, jogou um recém-nascido numa lata de lixo chegar ao último capítulo como o campeão de audiência e preferência do público mostra que, como diria o Caetano, ‘alguma coisa está fora da ordem’.
            
No cenário musical, o destaque fica por conta de uma nova categoria, os MCs, que nos brindam com a ‘poesia’ do funk tocado em bailes da periferia, agitando a galera que sacode, frenética, fuzis e quadris, no mesmo ritmo. Pra citar apenas dois ídolos do momento, se tiver coragem, click em http://musica.com.br/artistas/mc-magrinho.html   e você vai conhecer o MC Magrinho, expoente do Funk Proibidão, ou dê um passeio pela obra do MC Guimê, o rei do Funk Ostentação.
 
Sou de uma geração que também viveu o encontro entre a Arte produzida no morro e na periferia e aquela que vinha do asfalto. O rock americano teve também sua versão tupiniquim. Só que esse encontro gerou Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil, Elis Regina, Raul Seixas... é pouco ou quer mais?
            
Pra não dizer que não falei de flores, está em cartaz em algumas (poucas) salas de cinema em BH o filme“Que horas ela volta?”, espetacularmente protagonizado por Regina Casé, que já havia mostrado seu brilho como atriz em “Eu, tu, eles”. É claro que a imensa maioria e as melhores salas estão exibindo obras primas como“Missão Impossível 5”, com o galã Tom Cruise. Aonde você acha que vai dar fila de adolescentes?
 
“Que horas ela volta", mais que um filme, é uma leitura nua, crua e preciosa de um Brasil de hoje e de sempre. Na tela, Regina Casé dá vida (e que vida!) a uma personagem que nos ajuda a entender nosso passado, tão recente, tão presente, ainda rescendendo a escravidão, e o cotidiano de um país dividido entre coxinhas e petralhas, sinhazinhas e mucamas.
Não perca, para não se perder...
  
Eduardo Machado
Escritor e educador
31/08/2015