“O Espírito Santo virá sobre ti, e o poder do Altíssimo vai te cobrir com a sua sombra” (Lc 1,35)

 

Hoje vivemos tempos conturbados e, para alguns, também bastante confusos. Muitos gostariam que, após tão longa caminhada, tudo fosse mais claro e evidente, ao invés de se sentirem outra vez tateando em busca de um caminho a seguir. Isso acaba provocando desconforto a quem desejava segurança e definições permanentes; mas, por outro,  o espírito de busca lhe dá agilidade e flexibilidade para levar a missão adiante, da maneira mais adequada a cada momento histórico.

 

Mons. Tonino Bello, que sonhava com uma Igreja de avental, imagem que se tornou muito popular entre nós nestes últimos anos, sonha também com uma Igreja como tenda:

 “A Igreja deve se parecer com uma pedra imóvel ou com uma tenda que pode ser desarmada ao nascer do sol quando o viajante se põe a caminho para enfrentar uma nova viagem? ...

 

A tenda ajuda a compreender que a Igreja é uma instituição transitória que simplesmente anuncia a Jesus Cristo; não se coloca ela mesma no centro e não assume aquele eclesiocentrismo da visão cristã, mas o Cristocentrismo. Jesus está no centro, e a Igreja aponta para Jesus. A Igreja está em marcha, a Igreja caminha com a humanidade, a Igreja não deve fincar raízes e se agarrar à terra para se firmar, como a ostra na pedra... A Igreja deve ser móvel, e a tenda talvez evoque melhor essa dimensão itinerante da Igreja...” 

 

O Advento é uma boa ocasião para fazer memória do futuro: do futuro que virá e do futuro que podemos antecipar. Porque o futuro não é o que ainda não existe; ele pode se fazer presente em forma de projeto e de promessa. Nós o antecipamos quando vivemos fraternalmente, quando lutamos em favor da paz, da justiça e da solidariedade.

 

Ao antecipá-lo, o Senhor se faz humilde e silenciosamente presente. Porque se faz presente, podemos esperá-Lo. Se não o fazemos presente, a esperança se converte em uma ilusão sem futuro.

 

A essência de nosso ser encontra-se à nossa frente, um secreto desejo de escapar da pequenez do já realizado. A terra está prometida aos que se põem em marcha para alcançá-la.

 

Ter saudades do futuro. Pressentir. Entrever. Suspirar. Manter o coração velando, mesmo quando dorme.

 

Esse é o dinamismo do Advento. 

 

“O futuro tem um coração de tenda”: assim Ermes Ronchi intitula um de seus livros. Não conhecemos por completo o caminho que orientará nossos passos, mas nos alegramos por ele e seguimos animados pelo Espírito e pela promessa do Senhor, montando e desarmando nossa tenda, sempre que necessário.

O contexto atual, social e eclesial, deve ser vivido como um tempo de reflexão e renovação, tempo para dizer “sim” ao futuro, “sim” para voltar a levantar-nos e aprender de nossos erros. Uma ruptura pode fazer emergir um “sim” a novas oportunidades, um “sim” para melhor conhecer-nos a nós mesmos, querer-nos, valorizar-nos e voltar a dizer “sim” ao novo que nos desafia. Na fé e na vida da comunidade, sempre é o “sim” que nos seduz e que abraçamos: o “sim” ao seguimento de Jesus, o “sim” a uma maneira de amar diferente, comprometida e apaixonante, “sim” ao evangelho, “sim” a um olhar contemplativo que vê o mundo com olhar admirado; dizer “sim” na Igreja é compromisso, fraternidade e universalidade, fazendo nossas as necessidades e os sonhos daqueles que também vivem motivados e inspirados por esse “sim expansivo”. 

 

Maria diz “sim”, faz-se peregrina e o futuro se escancara diante dela. Enquanto muitos teriam buscado explicações, a ela lhe bastou uma simples saudação: “Alegra-te, cheia de graça, o Senhor é contigo”. Onde muitos veriam uma loucura, ela viu um horizonte aberto e um futuro de sentido; onde muitos teriam buscado provas, garantias, ela respondeu: “Faça-se em mim segundo tua Palavra”. 

 

Inspirando-nos na atitude de Maria, queremos nos instalar no provisório, na tenda, e ir avançando junto com os outros, discernindo os chamados do Espírito. Não gostamos apenas de imaginar a Igreja como uma tenda, mas de aceitar com alegria morar nela, com tudo o que isso significa de mobilidade, de temporário, de adaptação, de viver na intempérie, porém também de acolhida, de relacionamento...

 

Santa Maria, tenda humilde do Verbo, movida somente pelo vento do Espírito. Como Maria, podemos nos converter em pessoas de esperança, abertas à novidade do Espírito, que espreita oculto nas dobras de nossa história. Podemos chegar a ser sentinelas da manhã, espreitando no horizonte sinais de esperança e de vida.

“Alarga o espaço de tua Tenda, estende tuas lonas sem temor, alonga tuas cordas, reforça as estacas!” (Is. 54,2)

 

            Seja uma TENDA sempre aberta: “entrada franca”.

- Nada de “cachorros” que atemorizem o visitante: seu caráter, seu orgulho, seu egoísmo, sua inveja, sua ironia, sua rudeza, seu autoritarismo...  Que o outro não se retire, suspirando: “Não tive coragem... tive medo que ele me mandasse embora, que risse de mim, que não me compreendesse...”

 

- Nada de longas esperas que desanimam: esteja sempre atento, nem que seja para um cumprimento, um sorriso, um aperto de mãos, caso você não tenha tempo para uma conversa.

Uns instantes de intensa atenção basta para acolher o outro.

 

- Nada de móveis que impeçam a circulação; mantenha sua tenda vazia, disponível. Não imponha seus gostos, suas ideias, seus pontos de vista. Nada de retribuições que custam caro: se você oferece alguma coisa, faça-o gratuitamente e nada espere em troca. Nada de contrato oneroso: “entra-se” e “sai-se” à vontade, com naturalidade, sem formalidades...

 

Passos para a oração

 

1. Formular uma oração de entrega e encontro.

2. Pedir ao E. Santo que amplie o espaço de sua Tenda.

3. Texto bíblico:  Lc. 1,26-38

4. Deus não é distância e solidão. Ele é infinitamente vinda,

    iniciativa, presença, libertação. Peregrino em sua direção,

    Ele bate, querendo entrar e ficar... mas aguarda.

    Quando Ele entra em sua tenda, tudo se modifica...

5. Deus possibilita cada um “entrar” em sua Tenda e

    captar em profundidade a sua realidade, a perceber a raiz do

    seu ideal de vida, como também suas contradições e ilusões,

    medos  e necessidades.

    Neste “mergulho” interno, cada um pode construir uma espécie de mapa da Tenda, com as regiões

    fortes e fracas, vulneráveis e criativas, transparentes e ainda misteriosas...

 

        Somos TENDA, lugar de encontro. Ele vem. Sua presença causa mudança.

                   TENDA, lugar de discipulado – olhar, escutar e seguir.

                   TENDA, lugar de unção-acolhida, serviço e adoração.

                   TENDA, lugar de lava-pés, servo, mandamento novo, amizade.

                   TENDA, lugar de inspiração do Espírito, de oração.

                   TENDA, minha realidade pessoal e lugar de encontro com o outro.

 

5. Agora responda: - como está sua tenda interior? Preparada para acolher o Senhor que vem? Há um “lugar sagrado” para Ele? Há espaço para os outros?

 

Pe. Adroaldo Palaoro sj

Diretor do Centro de Espiritualidade Inaciana – CEI