Avançamos na terceira semana do Advento! Somos convidados a alegria, depois da vigilância e do despertar... Alegria que não se confunde com a euforia, o prazer imediato ou a tênue satisfação do consumo! Uma alegria que experimentamos apesar de nossos limites, descortinando as infinitas possiblidades que carregamos em nosso ser. Atitude que não se fia na riqueza, fama, honra, beleza, força; posses exteriores que também são efêmeras, que mais cedo mais tarde acabaremos por perdê-las!
Cabe-nos, como seres humanos, descobrir a alegria de nosso verdadeiro existir e viver na perspectiva de que ser feliz (ou miserável) não depende das circunstâncias ao nosso redor, mas de como cada um de nós responde aos desafios que se nos apresentam. Viver - alegrar-se - “é afinar o instrumento, de dentro p’ra fora, de fora p’ra dentro, a toda hora, a todo momento” (Walter Franco).
E mais uma vez nos inspira João, o Batista, enviado por Deus para dar testemunho da luz. Ora, a luz não podemos percebê-la diretamente: nosso olho vê objetos porque refletem a luz que os atinge! Tudo o que vemos são reflexos da Luz, espelhos da Luz. Não vemos a luz, como não vemos nossos olhos... Vemos através da Luz, contemplamos seu refletir. Pois, não conhecemos aquela luz infinita e distante que habita as alturas, mas aquela luz terrestre e comum, que ilumina cada ser humano e cada história, luz que acaricia cada criatura sem jamais se cansar.
João é o “mártir” da luz, é um punhado de luz atirado na face do mundo, não para deslumbrar, mas para despertar as formas, as cores e a beleza das coisas, para ampliar o horizonte. Testemunha de que a pedra angular sobre a qual a história repousa não é o pecado, mas a graça, não é a lama, mas um raio de sol, que nunca desiste de transfigurar a face da terra. “Luz do sol que a folha traga e traduz...” (Caetano Veloso)
Questionado sobre sua missão e atuação, João nega privilégios, prestígios e expectativas. Diz com firmeza: “não sou a Luz, o Messias, o Profeta ou Elias”! Não se identifica com os preceitos e normas de seus contemporâneos. Sabe dizer “não” aos poderes instituídos para revelar o sim de Deus! É a voz que anuncia a Palavra. A voz que agora escutamos e se perderá no vento, traduz a Palavra, expressão verdadeira do divino amor, que é desde sempre e para sempre. A voz serve à Palavra. A Palavra procura uma voz para se manifestar! “Tua palavra na vida é suave melodia, revela toda verdade e converte a rebeldia!” Eis aqui também sua alegria: preparar o caminho do Senhor!
Aquele homem que habita o deserto, de poucas (e densas) palavras, julgado como sem mérito, é exatamente o oposto de um balão inflado, de uma peça publicitária, tão comum em nossos dias. Ele fala simplesmente sem adicionar títulos ou habilidades; desapegando-se de tudo mostra-nos, assim, o caminho para o essencial, o verdadeiro, o real. Não se é profeta por acúmulo, mas por despojamento: falo palavras que não são minhas, que vêm de antes de mim, que irão para além de mim. Eu não sou o que os outros dizem sobre mim. O que me torna humano é o divino em mim; a luz que faz refletir minha humanidade... A vida vem do Outro (de Deus), flui na minha pessoa, como a água no leito de um riacho. Não sou essa água, mas sem ela nada sou mais. Eis a nossa alegria!
A cada crente é confiada a mesma missão do Batista: anunciar não a degradação, o colapso, a podridão que nos ameaçam, mas os olhos que veem Deus caminhando entre nós, sandálias de peregrino e um coração de luz! Entre nós Ele está: não o conhecemos ou reconhecemos! Sua luz e sua presença nos tocam e atravessam. Por isso, acolhamos os conselhos do apóstolo Paulo aos Tessalonicenses: “Estejam sempre alegres! Rezem sem cessar. Em todas as ocasiões, agradeçam e expressem gratidão. Não apaguem nem esgotem o Espírito! Nem desprezem as profecias, mas a tudo examinem, guardando o que for bom, belo, justo e agradável. Afastem-se de toda espécie de maldade!” (conforme Primeira Carta de São Paulo aos Tessalonicenses 5,16-22)
Se o mundo atual mais nos parece um «deserto», a serviço da verdadeira alegria queremos estar: apontando os belos reflexos da Luz, anunciando a Palavra com esperança, convidando as pessoas para mergulhar na fonte da misericórdia e do perdão, revelando algo que experimentamos de Deus e Seu amor, algo sabe sobre a «fonte» e de como se acalma a sede de felicidade que há no ser humano. A vida está cheia destas testemunhas, talvez pequenas a nossos olhos, mas certamente enviadas por Deus. São crentes simples e humildes, pessoas muito boas, vivem da verdade, do amor e da alegria. Eles “nos abrem o caminho para Deus”, apontam-nos a Luz que já está entre nós. Que, em breve, possamos ouvir de Jesus: “vocês são a luz do mundo.” Amém
Pe. Paulo Roberto Rodrigues
Festa de Nossa Senhora de Guadalupe, padroeira da América
12.12.2020