Conferir ou descobrir sentidos é parte constitutiva da condição humana, despossuída do conforto propiciado pela intensidade da pressão instintiva que caracteriza as outras espécies. Para nós, a dimensão instintiva, mesmo que a expressão soe inadequada, está presente, mas aguarda uma leitura de nossa parte, espera de nós uma interpretação. Práticas alimentares, afetividade, vida espiritual, trabalho e linguagem ocorrem num horizonte desenhado por nós e ganham o colorido do tempo e do espaço a que pertencem. Tudo isso, e muito mais, constitui o âmbito da cultura, esse meio em que vivemos e que nos apresenta o mundo. É a partir dos recursos disponibilizados pela cultura que podemos viver, de modo pessoal e significativo, a aventura da existência. Rompida a relação entre o que singulariza cada um de nós e o que a cultura oferece, é inevitável uma dose suplementar de sofrimento, acompanhada da percepção, sempre dolorida, do estreitamento da vida.
Falamos sem cessar, com razão, em mais cidadania, mas quase sempre nos atemos às suas dimensões mais materiais. O que é importante, sem dúvida, mas não deve nos distrair de que a indigência simbólica é tão cerceadora e restritiva quanto qualquer outra. Privados dos recursos simbólicos, dos instrumentos com os quais podemos nos aproximar do que a vida humana tem de mais permanente, o mundo aparecerá como um lugar hostil, marcado apenas pelo que a vida tem de mais brutal.
Talvez os que insistem na importância da educação e na tese de que essa é, agora, a fronteira por onde o País pode avançar tenham razão. Mas certamente é preciso discutir o que entendemos e o que esperamos da educação. Mas isso é assunto para a próxima coluna.
Para pensar na quinzena:
“Cultura é o que nos salva do naufrágio vital, o que permite ao homem viver sem que sua vida seja uma tragédia sem sentido ou um aviltamento radical. (Ortega y Gasset)
Ricardo Fenati
Equipe do Centro Loyola