Durante muito tempo a sombra do coronavírus permanecerá entre nós. Mesmo que tenhamos sido bem sucedidos na obtenção de uma vacina, ou mesmo de um medicamento eficaz, e tomara que o sejamos, esse tempo de hoje é de uma dor incomensurável. Muitas vidas estão sendo perdidas, rituais de passagem que conferem um rosto humano à morte estão suspensos, dificuldades econômicas se multiplicam, a sociabilidade está fragmentada. Seria mais que legítimo esperar ações de uma liderança política consciente da gravidade da situação, mas não é esse o caso. Pelo contrário, o que torna o sofrimento de todos ainda maior é a patética e inconseqüente insensibilidade do governante maior da nação. 

Seremos, mais adiante, capazes de contar essa história, de dar a ela um rosto humano onde possamos nos reconhecer?  Faremos isso, ainda que aos poucos, será condição de nossa sobrevivência como comunidade. Nós nos recordaremos do heroísmo cotidiano de tantas pessoas, dos que permaneceram solitários, dos que não puderam ficar em casa, dos que se sacrificaram, dos que estiveram na linha de frente; estarão nos nossos corações os inúmeros exemplos de solidariedade cotidiana que permitiram que tantos atravessassem a crise com um mínimo de dignidade. Também nos lembraremos dos que se foram, dos que não serão reencontrados. E, talvez, o coração comovido nos recorde de que andávamos esquecidos de nossa humanidade, seduzidos, iludidos pela busca de uma ilimitada segurança. E, quem sabe, volte a fazer parte de nossas vidas a atenção a valores mais capazes de tornar a vida humana significativa e solidária. Teremos aprendido que a fragilidade de nossa condição recebe sustentação da bondade, da justiça, da tolerância, da beleza, da verdade, do amor? 

Ricardo Fenati

Equipe do Centro Loyola