Trata-se sempre, ao longo do Diário, de permitir que alguma coisa venha à luz, de acolher o que parece, de início,  estranho avesso.  “Às vezes posso, de improviso, de forma clara e nítida sobre determinada matéria, grandes pensamentos vagos, quase impalpáveis, que fazem com que eu de súbito me sinta muito importante. Porém, quando tento escrevê-los, acabam encolhendo e não dando em nada, e por isso também não tenho ânimo de ordená-los no papel, pois é provável que eu fique decepcionada com o ensaio insignificante que resultaria. Mas agora vou dizer uma coisa com muita ênfase: não conte com a concretização das grandes ideias vagas...

Claro, você se atém a seus pressentimentos e intuições, são fontes de onde você bebe, mas cuide para não se afogar na fonte. Organize um pouco as coisas, faça alguma higiene mental. Suas fantasias, emoções profundas etc. são o enorme oceano, dali você tem que extrair minúsculos pedaços de terra que serão outra vez inundados. Um oceano assim é por demais vasto e elementar, mas o importante são os pequenos pedaços de terra que se consegue conquistar ali.”. Isto é escrito na Holanda, em março de 1941, portanto sob a sombra perversa do nazismo.

Ricardo Fenati

Equipe do Centro Loyola