O alto e baixo das montanhas, as curvas dos rios, os silêncios dos bosques e das florestas, a serenidade dos lagos, o silêncio dos grandes espaços desabitados, tudo isso é anterior ao saber geográfico. A geografia vem depois, nomeando, discriminando, ordenando. Certamente é útil esse saber, mas não devemos nos esquecer que ele se assenta na experiência humana da paisagem. Outros saberes conservam mais, abrigam mais a experiência primeira: a pintura, a poesia, a arte em geral. E não poucas vezes um quadro amplia nosso olhar, permitindo ver melhor a paisagem sobre a qual nos debruçamos. Alguém já disse que o pintor vê o que pinta, mais do que pinta o que vê. E nós o seguimos, vemos por meio da arte, que não busca a compreensão pelas vias habituais.

Mas se voltamos sobre nós mesmos, se é das paisagens internas que nos ocupamos, não será diferente o que se passa com a experiência, essa visita que fazemos a nós mesmos. Se os movimentos internos são menos perceptíveis, mais indeterminados, por outro lado, são os que estão sempre presentes. Mais difíceis de nomear na sua singularidade, permanecem, quase sempre, à margem do nosso fascínio por palavras. Também aqui um saber se avoluma, e é importante, mas assim como a geografia, é posterior a vida dos sentimentos, à escuta do que se passa em nosso coração. Acostumados à prontidão das palavras, atraídos pela explicação, abordamos as paisagens internas rápida e descuidadamente. Recursos antigos como histórias e narrações, assentadas sempre na experiência vivida, tendem a desaparecer, cedendo lugar a palavras de ordem, vindas das ciências humanas ou de uma persistente voracidade verbal que as redes sociais não fizeram senão multiplicar. Palavra e silêncio, essa passagem incessante da sombra à luz e da luz à sombra, via tradicional do percurso em direção a nós mesmos, estão dando lugar a uma onipresença do que é apregoado como saber. O silêncio é um antídoto, uma distância dessa pressa em falar, uma passagem da volúpia das palavras, para um estado mais contemplativo, mais aquietado, e ainda mais decifrador. À contemplação, que é propiciada por uma experiência da Alteridade, associa-se um consentimento de nossa parte, um acordo feito com o real, com o que, ainda que presente em nós, não cessa de nos interrogar e nos exceder.   

 

Ricardo Fenati

Equipe do Centro Loyola

17.07.2025