A linguagem, na diversidade de suas formas, é certamente um dos fatores decisivos da identidade humana. Gregos já se referiam aos humanos como animais racionais, isto é, capazes, entre outras coisas, de lançar mão da linguagem. O acesso à linguagem é não apenas condição geral da cultura, como também possibilita o desvendamento de aspectos da realidade que, de outro modo, permaneceriam ocultos para nós. Sem a literatura ou sem a matemática, quantos mundos continuariam fechados para nós? Assim, há os que insistem no alcance crescente e mesmo ilimitado da linguagem. E são inúmeros os casos de sucesso da linguagem, seja no entendimento do mundo, seja na conversação entre nós. Entretanto, isso admitido, seria um salto despropositado insistir que a linguagem varre inteiramente o real como a luz varre a sombra. Se a linguagem desvenda mundos, não é porque os cria, mas porque os traz à luz e se ela parece infinita é porque o real de onde ela brota é, antes, infinito. Por vezes, no uso mais imediato, esse à nossa volta, a linguagem não apresenta qualquer problema, põe o mundo à nossa disposição. Mas nem sempre é assim. Quando saímos das dimensões pragmáticas da vida, quando nos aproximamos das questões mais decisivas da vida, quando as interrogações são mais amplas, esbarramos sempre com o que escapa de qualquer linguagem e que excede a qualquer tentativa de conformação. Aí somos colhidos pelo sentimento intenso da existência, pelo mistério a que pertencemos e que solicita de nós o silêncio respeitoso e expressivo que tem lugar quando toda linguagem encontra seu limite.
Ricardo Fenati
Equipe do Centro Loyola