Mapas e lugares são coisas distintas. É certo que nenhum mapa, por mais detalhado que seja, substitui ou equivale a uma visita ao lugar. Do mesmo modo, experiências quando relatadas, ou mesmo recordadas, perdem muito do sabor original. Isso costuma nos levar a insistir na primazia da experiência, o que não está errado, mas também a recusar qualquer valor ao relato e à reflexão, o que não parece certo. Vamos a um exemplo: alguém que tenha uma experiência da presença de Deus. Uma tal presença é sentida com intensidade, guardada na memória e parece sempre exceder qualquer descrição. É ainda com essa presença viva no coração que alguém pode desconsiderar a reflexão teológica, o discurso sobre Deus, como abstrato, árido e distante da realidade. Mas vejamos se isso é tudo. De início, é bom lembrar que a teologia, cunhada ao longo do tempo, se alicerça nas experiências vividas por inúmeras pessoas, o que confere a ela uma universalidade que reflete a riqueza da experiência religiosa. Acrescente-se a isso o fato de que a experiência mantida na esfera do sujeito é destituída de qualquer valor formativo de mais longo alcance. A linguagem tem esse poder disseminador que permite o vislumbre de horizontes que, não sendo assim, permaneceriam desconhecidos. Não se trata de escolher um ou outro caminho, de decidir entre a experiência vivida e o caminho da reflexão, mas de entender a circulação permanente entre os dois domínios. São distintos os seus significados e se há uma preponderância da experiência, fonte última da reflexão, não há porque negar o papel da reflexão enquanto possibilidade de desvendamento da experiência. Ganharíamos todos se mantivéssemos atentos aos dois domínios.

Ricardo Fenati

Equipe do Centro Loyola 

18.02.2021 

Imagem: pexels.com/anni-roenkae