Filosofia, como sabemos todos, é a junção numa palavra de duas fontes, amor e sabedoria, amor à sabedoria. Paixão pelo conhecimento, gosto pelo saber, confiança na nossa capacidade de decifrar, lançando mão da razão, do que se passa à nossa volta, o que se passa em nós mesmos. Distancia-nos do que é mais imediato, do que é costumeiro, da tradição e escolhe o caminho mais longo da dúvida, da análise, da compreensão. E, nesse sentido, mais do que uma disciplina, é uma atitude, um modo de estar no mundo. E com isso somos nós os que ganhamos, já que o mundo, quase nunca, se oferece a um primeiro olhar ou pode ser capturado na rotina que o reveste.

 

Entretanto, como tudo que leva a marca humana, nem mesmo um bem, ainda que inequívoco, se subtrai à possibilidade do descontrole, da desmedida. Despregadas das urgências do dia a dia, as ideias correm soltas e não poucas vezes, esquecidas do calor da vida, perdem-se narcisicamente em si mesmas ou num confronto meramente barulhento. Sem o sustento das travas de onde brotam e para onde devem retornar, a vida na sua infinita riqueza, flutuam num vácuo onde tudo é igualmente plausível. A distância, de início tão necessária, torna-se extravio estéril.

 

Diluído o nosso pertencimento às pessoas e ao mundo, esquecida nossa filiação  originária, pouco ou nada pode contar o conhecimento. É de nossa mundaneidade, é dos laços que unem amorosamente à existência que brota e permanece o melhor de nós mesmos. É dessa terra fértil que também nasce o conhecimento no que ele encerra de mais legítimo e de mais libertário. Então, quem sabe não é hora de reequilibrar nossas duas fontes, philia e sofia?

 

 

Para discutir na quinzena:

“Longe de ter que salvar sua alma, o homem deve ganhá-la na paciência”.  

(France Farago, a propósito de Kierkegaard)

 

Ricardo Fenati

Equipe do Centro Loyola-BH