Um rio jorra entre o porão e o sótão:
leva dores e amores, e nosso último riso
há tanto tempo.
Mas numa curva qualquer, porque de novo amamos,
tudo pulsa e brilha de ousadia,
sabendo que temos pela frente
esse calor, esse rumor de águas na areia.
Passa no meio de nós, entre o sonho do sótão
e o medo dos porões, o rio da vida:
que me leve para ti ainda uma vez e muitas,
que venhas até mim antes daquela curva
com a audácia e o fervor que tínhamos perdido.
Lya Luft
In: Secreta Mirada. São Paulo: Mandarim, 1997.