Há exatamente 60 anos, em 1959, vê a luz nas brancas praias da baia de Guanabara um gênero musical destinado a mudar para sempre a tradição brasileira e a espalhar-se no mundo como uma marca ao luar.

Porque esta é a bossa nova, que brotou principalmente do gênio de Tom Jobim, Vinicius de Moraes e João Gilberto, falecido este sábado, 6 de julho, aos 88 anos: uma música distante da fulguração ofuscante do samba das escolas cariocas, uma música “lunar” precisamente porque capaz de fazer caminho como um murmúrio, mas, inevitavelmente, como uma clarão noturno.

Nenhum clamor rítmico, nenhuma vocalidade extrema, mas, ao contrário, cadências apenas esboçadas pelas cordas baixas da guitarra, e um fio de voz a “sussurrar” o texto.

Há exatamente 60 anos, em 1959, era publicado o disco de João Gilberto que segundo a crítica assinala o nascimento oficial da bossa nova. Trata-se de “Chega de saudade”, um “long-play”, como se dizia antes, que contém uma dúzia de trechos, alguns dos quais escritos por Tom Jobim e Vinicius de Moraes.

Pequenas obras-primas, como o título do álbum ou “Desafinado”, tornadas célebres pela guitarra de João Gilberto, chamada de “violão gago”, isto é, balbuciante para o andamento sincopado, e pelo seu canto “baixinho”.

A partir de então, a música brasileira não seria mais a mesma; a bossa nova teve a força de desencadear uma dinâmica de contaminação cultural que a levou a tornar-se o único gênero diretamente proveniente do sul do mundo (e, portanto, não importado por escravos ou minorias de migrantes) capaz de “colonizar” a música norte-americana.

Ao mesmo tempo que o “beat” começava a fazer prosélitos também no Brasil, alguns jazzistas dos EUA aperceberam-se da grandíssima potencialidade inovadora da bossa nova, e não hesitaram em mergulhar nas suas atmosferas. E o sucesso foi enorme. Em 1964, João Gilberto editou, juntamente como o saxofonista Stan Getz, um álbum que chegou a derrotar os Beatles na corrida aos prêmios Grammy.

Mas a herança do músico brasileiro e dos seus companheiros continuou ativa ao longo das décadas. O tropicalismo, movimento cultural nascido na Bahia, estado natal de João Gilberto, deve muito à bossa nova, e músicos do calibre de Caetano Veloso não perdem a ocasião para prestar tributo àquele grupo de jovens que há 60 anos sussurraram ao mundo algumas canções que, à luz da lua, continuam a ressoar. Como as ondas da baía de Guanabara.

Giuseppe Fiorentino 
In L'Osservatore Romano 
Trad.: Rui Jorge Martins 
Publicado em 09.07.2019 no SNPC