Existem pessoas que se identificam com os valores católicos, mas não participam da vida comunitária em paróquias, associações ou movimentos e, por isso, dizem ser (ou dizemos nós que são) católicos não-praticantes. Sempre achei essa expressão muito estranha. É como se uma pessoa casada dissesse - «sou esposo, mas não praticante.» Não faz sentido.
A linguagem católica pode ser, por vezes, mais prescritiva do que persuasiva. Durante muito tempo falou-se (e fala-se ainda) daquilo que não podemos fazer, dizer ou pensar. A linguagem que começa com um “não” gera bloqueio. E há quem diga — «Mas existem situações em que temos de dizer “não”.» — ou talvez a linguagem precise de uma renovação. Sempre que alguém amigo ou conhecido nos diz ser um católico não-praticante, temos a oportunidade de renovar a nossa linguagem e a sua experiência, começando por um “sim” — «Sabes, eu penso que tu és antes um católico simpatizante.»
A linguagem bloqueadora do não fecha as nossas comunidades aos católicos simpatizantes que possuem uma experiência maior do que nós quanto ao modo como o mundo pensa fora do âmbito católico. E se abraçarmos o significado da palavra “católico”, que quer dizer “universal”, ninguém está fora senão aquele que se coloca fora por opção pessoal. Alguém que acolhe na sua vida os valores católicos, sem participar de qualquer vida comunitária, reconhece o seu valor universal e ao contrastar-se com valores diferentes desses diante de outras pessoas afastadas do catolicismo, pode fazer experiências católicas (universais) sem ser conotado de “católico”. Por isso, a sua vivência tem valor universal fazendo dele um católico simpatizante.
As pessoas afastam-se das Igrejas e comunidades católicas por sermos abertos ou fechados? Estou a incluir-me no grupo de católicos praticantes, e a pergunta parece retórica, mas a minha experiência é que os católicos consideram-se pessoas abertas, mas os outros sentem que são fechadas. Por outro lado, quem se considera um católico simpatizante, sente ser aberto e que participar numa comunidade católica levaria a fechar-se. Não conheço a experiência do leitor, mas a minha é a de que somos todos abertos “e” fechados. Porém, o caminho a percorrer juntos talvez seja o de sermos abertos e ponderados.
Ser ponderado implica pensarmos sobre as coisas antes de nós pronunciarmos sobre essas. E mesmo quando o fazemos, convém trabalhar continuamente a humildade por desconhecermos aspectos essenciais que podem fragilizar a nossa opinião. Um exemplo seria a moral sexual. Muitos católicos simpatizantes e praticantesdesconhecem os grandes desenvolvimentos que se deram no pensamento e experiência católicas desde que S. João Paulo II introduziu a Teologia do Corpo. Um outro exemplo seria a relação com a ciência. Muitos católicos simpatizantes e praticantes desconhecem aquilo que chamaria de Teologia da Dúvida onde o diálogo científico-teológico se torna um modo de nos aproximarmos de uma experiência de Deus menos infantil e mais profunda.
O católico não-praticante é aquele que possui valores católicos, até pode participar da vida comunitária, mas não vive e dá testemunho desses valores. Basta pensar naquelas pessoas criticam sempre os outros, exercem abuso de autoridade ou de outra natureza ou não dão espaço ao amor recíproco, achando-se donas dos empenhos ou lugares religiosos que lhe foram confiados. Por outro lado, um grande desafio para os que simpatizam com os valores católicos será desconhecerem esses valores em profundidade suficiente, de tal modo que as razões de não participarem na vida comunitária são pobres.
Uma vez fui a um grupo de jovens nas Mercês próximo de Sintra. Um dos jovens que participava assiduamente nos encontros era ateu. Não acredita em Deus, mas acredita e vivia o valores católicos. Era um católico simpatizante para quem Deus é um Mistério “inacreditável”. Gostaria de ser mais como ele porque as pessoas inacreditáveis são aquelas que não cessam de nos surpreender, como Deus.
No tempo presente em que entramos numa dimensão religiosa mais orientada para a espiritualidade, parece-me relevante reconhecer que todo o católico simpatizante que não vai à missa ou participa na vida comunitária, não está fora, mas dentro da Igreja. Ele habita nas periferias existenciais da sociedade, trabalho, e lá procura (quer se dê conta ou não disso) uma união com Deus através dos valores católicos do amor fraterno, misericordioso, sincero e autêntico. A sua missão é alargar os espaços eclesiais que não se definem pelas estruturas físicas, mas pela vivência dos valores. Por isso, da próxima vez que alguém te disser ser um católico não-praticante, oferece uma correção fraterna pacífica dizendo-lhe com serenidade que ele é antes um católico simpatizante.
Miguel Oliveira Panão
In: imissio.net 20.04.23
Imagem: pexels.com