A tristeza colocamo-la longe. Ou atrás de uns óculos de sol que nunca se tiram, mesmo quando chove muito.
Colocamo-la num frasco todo preto para que ninguém a vislumbre e atamo-la com cordas fortes. Depois, atiramo-la para dentro do mar mais longínquo que habite os meandros da nossa alma.
Não há lugar para a tristeza no mundo onde vivemos. Neste universo de maquinaria, ritmo, produção máxima e positividade a todo o custo não se senta ninguém na cadeira da tristeza. Até na da raiva ousaríamos sentar-nos. Até fica bem partir uns pratos ou uns copos para descarregar as emoções, como se vê nos filmes. Até da raiva se fazem bons filmes. Agora da tristeza? Essa anda pelas ruas, suja, vestida com roupas de ninguém e com contornos de corações velhos. De mão estendida e alma ao peito, à espera de quem a veja. De quem a queira sentir.
Não fiques triste. Não é assim tão mau. Choras depois, em casa. Pensas nisso depois, quando ninguém estiver a ver.
E assim vamos enganando a “pobre” tristeza e a nossa própria pobreza. Enquanto vamos atirando a tristeza para longe, limpando as lágrimas às escondidas e respondendo com disfarces absurdos onde já ninguém cai, estamos a adiar-nos. Estamos a escolher sentir tudo isso, um dia, sem aviso prévio e numa dimensão de tsunami pouco condizente com a nossa natureza do politicamente correto.
Somos tão tristes quando não nos deixamos ficar tristes.
Somos tão pequeninos quando não queremos sentir o que TODOS sentimos.
Tanta vergonha de estar triste.
É preciso pôr a tristeza na primeira fila. Evitar colocá-la na segunda plateia ou nos camarotes com pouca visibilidade. Isto se quisermos evitar que, um dia, nos inunde sem pedir autorização.
Quando vires a (tua) tristeza, vestida das tuas cicatrizes velhas e novas, das roupas da alma que já não vestes, vê se tens a coragem de olhar também para ela e de lhe dar a esmola da tua atenção.