Retomo a conversa da coluninha anterior, a que versava sobre a experiência humana da cidade. Nela, era simples o que se defendia: somos feitos para a proximidade, na variedade de suas formas. E possibilitar isto é esta a virtude maior das cidades. Mas nossas cidades, de uma forma geral, cumprem, hoje, apenas parte desta função. Por motivos que vão da desigualdade social ao gigantismo das metrópoles, da troca da convivência das ruas pela solidão das casas, da devoção à TV à sensação generalizada de insegurança, nossa existência se passa, na quase totalidade do tempo, em espaços privados. Desconhecemos os diferentes de nós, receamos, parodiando o verso de Caetano Veloso, o que não é espelho. Isto quando não descambamos para o ódio. Estamos, e aqui eu exagero um pouco, revertendo o movimento que deu origem às cidades medievais e voltando aos novos feudos, que dos antigos repetem, sobretudo, o que havia ali de limitação. Saímos pouco de nossas casas de nossos prédios, de nossos bairros, de nossos condomínios e por aí afora. Há uma privacidade que é mera privação, desistência que estiola e avilta o horizonte das possibilidades humanas.
Cabe esperar alguma mudança neste cenário? Certamente, não suportaremos isto por muito tempo mais, não somos capazes de permanecer para sempre tão reticentes e defensivos. Aqui e ali, movimentos variados começam a apontar para a necessidade da reconstrução de espaços públicos que, podendo ser de todos, não pertencem a ninguém em particular. Ainda não sabemos bem porque fomos para tão longe uns dos outros e nem será simples reverter a situação, mas, como temos pouco a perder, é hora de lembrar, uma vez mais, que a diversidade, quando aproxima, humaniza e, quando distancia, leva à indiferença.
Para pensar na quinzena:
“Sou homem: não julgo alheio a mim nada do que é humano” (Terêncio, 195/185 – 159 a.C)
Ricardo Fenati
Equipe do Centro Loyola
15.06.2012