Somos feitos uns para os outros, prova disso é o prazer, mais que o prazer, a doçura de uma companhia. Não falo de amor, embora a amizade tenha sempre um traço amoroso, amor é um sentimento mais tumultuado, nem sempre tranqüilo. Amizade não, é mais calma, o amigo ou a amiga se retiram para que o outro fale, conte o que sente, reclame, esbraveje. O que damos na amizade não se importa muito com a reciprocidade, é paciente, confiante que um dia somos ombro, noutro é somos o que encosta a cabeça. Amizade talvez só tenha uma exigência, o cultivo. Mesmo de longe, se não podemos estar perto, a saudade é uma forma de cultivo. Amigos brigam? Às vezes, mas a volta, que nunca demora muito, é uma pequena festa, pequena só por fora. Amizade, mais do que qualquer outro encontro humano, é capaz de ouvir a alma do outro, sem julgar, mesmo na discordância. Amizade é chuva fininha à noite e brisa suave à tarde. E nesses tempos de encontros (quase) impossíveis tomara que sejamos capazes de reinventar formas, mesmo que precárias, de encontro. Emails mais longos, já que nos falta a proximidade mais duradoura, corações que a distância saudosa nos convida a revelações que demorariam mais para vir à tona, reconciliações com os que não sabíamos quão preciosos eram. A mesma alma em dois corpos, alguém já disse isso. Não é assim mesmo?
Ricardo Fenati
Equipe do site. 23.06.2020